terça-feira, 28 de abril de 2009

Vidas de Lennon



Terminei de ler a biografia de John Lennon escrita por um tal de Philip Norman (o mesmo sujeito que em 81 teria publicado, de acordo com as suas próprias palavras expressas no posfácio, uma biografia 'definitiva' sobre os Beatles, "Shout"). Embora tenha precisado de duas semanas para digerir suas mais de oitocentas páginas, fiquei, já a partir da metade do livro, com uma sensação indisfarçável de fastio. Terminei a travessia com o espírito mais desanimado do que quando a iniciara.
Nada a ver com a personalidade multifacetada e intrigante de Lennon. O estilo de abordagem do biógrafo é que me pareceu muito sensacionalista e um tanto leviano. Aspectos mais interessantes da sua vida, como o processo criativo de suas músicas, ou o impacto da fama e do dinheiro sofrido pelo rapaz relativamente simples e comum, não receberam, ao meu ver, o devido cuidado.
A abordagem é sobretudo factual. O que aconteceu no dia x ou em época z. De tal maneira que em algumas passagens fiquei com a impressão de ler não uma biografia com pretensões de atingir o estatuto de uma obra marcante, mas a de um mero diário sobre celebridade já falecida.
Claro que sobra espaço para avaliações críticas acerca do homem e da obra. Mesmo assim, me pareceram ou decepcionantes, ou insuficientes.
O fio condutor do livro parecia se desencadear mediante o mote seguinte: quanto mais sombra e luz forem derramados sobre a figura biografada, mais provocativos e complexos o personagem e a narrativa se apresentariam à imaginação ávida por contrastes do leitor. Contudo, o efeito deste dispositivo, quando mal articulado, ou abastecido por pouca imaginação, faz transparecer o artifício da empreitada, prejudicando assim a própria realidade retratada. Claro que Lennon era figura assaz contraditória, sendo capaz desde os atos mais generosos aos mais grosseiros e mesquinhos. Sua afetividade flutuante o tornava uma pessoa quase impossível de conviver. Embora profundamente sarcástico e detentor de visões tão perspicazes quanto corrosivas acerca do mundinho burguês sobre o qual ele mesmo construiu sua glória, talvez nunca tenha deixado de ser um novo rico deslumbrado e incapaz de lidar com questões de poder e dinheiro.
Todos esses vislumbres do indivíduo de carne e osso - genial como ninguém mais e limitadíssimo sob diversos aspectos - não são esquecidos por Philip Norman. Pior, são desperdiçados numa prosa sem viço e em olhares que não conferem nada de novo às dimensões já sedimentadas pela tradição popular de nosso tempo. A biografia se faz ínfima diante do homem capaz de se expor, como poucos artistas modernos, de forma tão talentosa e criativa, na própria obra.

segunda-feira, 27 de abril de 2009